Gestão Emocional: por onde eu começo e onde posso chegar?
Com certeza você já ouviu dizer que os seres humanos são indivíduos emocionais, mas você sabe o que isso quer dizer? Ao longo da história evolutiva, as emoções surgiram como um método de agilidade e eficácia na emissão de respostas ao ambiente, então quando sentimos uma emoção, estamos reagindo de uma maneira selecionada durante milhares de anos. Entretanto, no contexto atual, reagir “emocionalmente” nem sempre pode ser a escolha mais sábia, ainda mais quando se vive em sociedade. Vamos entender um pouco mais sobre como a gestão emocional pode ser de grande valor?
Para começar, o que são emoções? E o que são sentimentos?
Quando você esteve em uma situação na qual reagiu de forma rápida, impensada, e precipitada, com certeza já ouviu um sermão no estilo “você é muito emotivo”, ou ainda “precisa começar a pensar antes de agir”. Essas são frases comuns que põe a emoção em contraponto com a razão, uma ambivalência que estamos acostumados no dia a dia, e que muitos usam para categorizar as pessoas em um ou em outro. Mas a verdade é que somos ambos, tanto emocionais como racionais.
“Razão e emoção não se separam: Antonio Damásio diz que a emoção é parte integrante do processo de raciocínio e, muitas vezes, o auxilia em vez de perturbá-lo, como se costumava pensar. Para ele, a emoção tem funcionado no decorrer da evolução.”
Leia mais no nosso texto ‘Dicas valiosas da neurociência sobre inteligência emocional‘
Entretanto, ao falarmos em emoções, há uma referência direta ao que sentimos e muitas vezes o conceito de emoção se confunde com o conceito de sentimento. As emoções são as respostas que nosso corpo dá para estímulos que possuam relevância, provocando assim as chamadas respostas emocionais. O sentimento, por outro lado, é a construção feita pelo nosso cérebro em cima das respostas emocionais que sentimos. Envolve como iremos perceber os estímulos do ambiente e integrá-los com nossas respostas a eles, avaliando-os e criando uma complexa resposta cognitiva.
Portanto, o papel das emoções é informar nosso corpo de tal maneira na qual é possível reagirmos de forma rápida e eficiente frente a uma determinada situação. Saber geri-las, e não necessariamente controlá-las, é extremamente necessário em todas as esferas da sua vida, tanto pessoal quanto profissional, e para isso é necessário exercitar sua inteligência emocional.
Inteligência Emocional
Inteligência emocional é a capacidade de reconhecer suas emoções, entender o que elas estão dizendo e perceber como elas afetam as pessoas ao seu redor. Também fala sobre sua percepção dos outros: quando você entende como eles se sentem, é possível gerenciar os relacionamentos de forma mais eficaz.
Alguns autores especificam a inteligência emocional de forma multifacetada, a depender da percepção da emoção, do entendimento da emoção e de sua regulação. Assim, a percepção da emoção, de forma causal, precede o entendimento da mesma, ou seja, primeiro sentimos e depois a entendemos. Só então somos capazes de agir sobre a mesma e a regular [1]. Essa sequência de elementos refletiria então no cuidado e diligência, na habilidade cognitiva e na tendência de experimentar emoções negativas.
Além disso, a inteligência emocional pode estar relacionada com a exaustão emocional, que resulta do trabalho emocional, e como essa exaustão pode refletir nos índices de performance no trabalho em termos de compromisso e satisfação. Fatores da inteligência emocional, como avaliação das emoções, otimismo e habilidades sociais já foram demonstrados como estando negativamente relacionados com a exaustão emocional, o famoso ‘burnout’ [2].
Gestão Emocional: O que é? Por que é importante?
Encarar emoções como construtos sociais implica que sua expressão pode ser conscientemente alterada para alinhar com as expectativas do contexto ao seu redor [3]. O campo da gestão emocional se refere a como os indivíduos são capazes de influenciar em quais emoções sentem, quando as sentem, e como são capazes de experienciá-las e expressá-las. Gerir suas emoções é ser capaz de compreender o que você está sentindo, conseguindo assim avaliar quais serão suas reações de forma mais madura e sábia. É importante destacar que é um processo de reconhecimento, e não de eliminação, evitação ou negação, afinal, adversidades fazem parte de nossa vida.
Portanto, reconhecendo como nos sentimos, conseguimos então guiar nossas ações para uma melhor interação com nós e com os outros, nos assegurando relacionamentos mais saudáveis. Garantimos assim maior controle do estresse e da ansiedade, melhora na comunicação e em relacionamentos, promovendo tomadas de decisão mais assertivas. Integrar a Inteligência Emocional com a Gestão das Emoções pode ajudar os indivíduos a encararem situações emocionalmente carregadas. [4]
Além disso, as emoções contribuem com um papel central no processo de tomada de decisão, anteriormente pensado como puramente racional. Diferentes estratégias de gestão emocional podem levar a diferenças no comportamento e performance profissional, sendo que as estratégias focadas no resultado muitas vezes podem acabar gerando prejuízos no mesmo [5]. Até mesmo na esfera pessoal, gerir suas emoções pode alterar seu viés quanto aos sentimentos de culpa e vergonha [6].
Como desenvolver?
Quando falamos em emoções, podemos regulá-las em 5 pontos distintos no seu processo de geração [7]:
- Seleção da situação;
- Modificação da situação;
- Implantação da atenção;
- Mudança de comportamentos;
- E modulação das respostas.
Assim, entram em jogo estruturas encefálicas como o córtex pré-frontal, que é sede da personalidade e da mente consciente, responsável pelo balanço de conflitos, pela análise de custos e benefícios e por prever consequências. A gestão emocional se dá pela regulação dos comportamentos adaptativos adequados ao ambiente e à situação, na tomada da consciência das emoções.
Para que este processo ocorra, devemos entender o que são essas emoções que estamos sentindo. Sob o mesmo ponto de vista, o processo de sabermos diferenciar quais emoções estamos sentindo é associado com diferenças em funções intrapessoais, mas também com habilidades interpessoais: a diferenciação das emoções de si mesmo se associa com o reconhecimento de emoções em outras pessoas [8]. Assim, quando entendemos melhor como nos sentimos, conseguimos entender melhor como os demais se sentem, o que pode nos auxiliar no processo de regulação das nossas emoções frente ao ambiente.
Por onde começar e onde posso chegar?
Iniciar um processo de gestão emocional pode ser bastante simples, mas como todo novo hábito, requer prática e repetição para que haja o fortalecimento de circuitos preferenciais. Pode-se começar com passos relacionados ao treino da inteligência emocional como:
- Tomando consciência da emoção que está sentindo;
- Entendendo os gatilhos da emoção;
- Planejando respostas adequadas ao ambiente e a situação;
- Agindo de forma pensada, enfrentando a situação com tranquilidade e expressando a emoção de forma assertiva.
Assim, esses pequenos passos para gerir suas emoções são capazes por exemplo de promover uma associação positiva entre domínio emocional e performance acadêmica, ao regular emoções relacionadas ao mundo acadêmico e melhorar a capacidade de construir relações sociais [9]. Além disso, a habilidade de gerir emoções funciona como um preditor de performance no trabalho [10].
Apesar de pequenos efeitos, estudos indicam que a reavaliação emocional é capaz de diminuir a frequência cardíaca, enquanto que a supressão emocional aumenta a atividade simpática do sistema nervoso autônomo [11], o que indica a ação da gestão em nossas reações fisiológicas.
Dicas de como chegar lá
Então, podemos pensar em algumas técnicas usadas por profissionais da saúde no controle das emoções consiste em compartilhar suas experiências e participar de atividades orientadas para a recuperação emocional após um evento de forte teor emocional [12]. Em profissões que sofrem um estereótipo de gênero, a gestão emocional deve também tomar proporções ligadas ao trabalho e às condições pessoais [13], por meio de estratégias como distanciamento, imposição de limites, relativização dos problemas e uso de distrações e humor como formas de lidar com a situação.
Portanto, podemos trazer ainda para mesa estratégias amplamente utilizadas e difundidas, como:
- Parar para analisar se o que está pensando agora é baseado em fatos;
- Se existe algum pré-julgamento;
- Trocar de ambiente para se acalmar e trazer novas perspectivas;
- Estimular o nervo vago através de respiração lenta e profunda;
- Compartimentalizar;
- Evitar decisões precipitadas;
- Se atentar a situações de evitação ou enfrentamento que podem ser prejudiciais;
- Redirecionar a atenção;
- Imaginar o futuro imediato;
- Meditar;
- Concentrar em vias de escape e redirecionamento de energia por meio de canais de expressão.
Assim, é possível se atentar em como reage às pessoas a sua volta, ao julgamento muitas vezes despercebido, olhando para a situação com uma perspectiva de alteridade e humildade. Aqui, a auto-avaliação de pontos fracos e a responsabilidade por suas ações faz com que as emoções sejam examinadas de maneira a promover um olhar analítico e que conversem da melhor maneira com a situação.
Recomendações de leitura
6 Ways to Manage Your Emotions and Improve Your Mood
Emotional Management Skills: What They Are and How To Develop Them
Livro – Inteligência Emocional: a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente – Daniel Goleman
Referências
[1] Joseph DL, Newman DA. Emotional intelligence: an integrative meta-analysis and cascading model. J Appl Psychol. 2010 Jan;95(1):54-78. doi: 10.1037/a0017286. PMID: 20085406.
[2] Moon, T. W., & Hur, W.-M. (2011). Emotional intelligence, emotional exhaustion, and job performance. Social Behavior and Personality: An international journal, 39(8), 1087-1096.
[3] Beal, D. J., Trougakos, J. P., Weiss, H. M., and Dalal, R. S. (2013). Affect spin and the emotion regulation process at work. J. Appl. Psychol. 98, 593–605. doi: 10.1037/a0032559
[4] Carminati L. Emotions, Emotion Management and Emotional Intelligence in the Workplace: Healthcare Professionals’ Experience in Emotionally-Charged Situations. Front Sociol. 2021 Apr 6;6:640384. doi: 10.3389/fsoc.2021.640384. PMID: 33889607; PMCID: PMC8055814.
[5] Mark Fenton-O’Creevy,Emma Soane,Nigel Nicholson,Paul Willman. Thinking, feeling and deciding: The influence of emotions on the decision making and performance of traders. Journal of Organizational Behavior. https://doi.org/10.1002/job.720
[6] van Dijk WW, van Dillen LF, Rotteveel M, Seip EC. Looking into the crystal ball of our emotional lives: emotion regulation and the overestimation of future guilt and shame. Cogn Emot. 2017 Apr;31(3):616-624. doi: 10.1080/02699931.2015.1129313. Epub 2016 Jan 4. PMID: 26727237.
[7] Gross JJ. The Emerging Field of Emotion Regulation: An Integrative Review. Review of General Psychology. 1998;2(3):271-299. doi:10.1037/1089-2680.2.3.271
[8] Israelashvili J, Oosterwijk S, Sauter D, Fischer A. Knowing me, knowing you: emotion differentiation in oneself is associated with recognition of others’ emotions. Cogn Emot. 2019 Nov;33(7):1461-1471. doi: 10.1080/02699931.2019.1577221. Epub 2019 Feb 8. PMID: 30734635.
[9] Kluemper DH, DeGroot T, Choi S. Emotion Management Ability: Predicting Task Performance, Citizenship, and Deviance. Journal of Management. 2013;39(4):878-905. doi:10.1177/0149206311407326
[10] Zaehringer J, Jennen-Steinmetz C, Schmahl C, Ende G, Paret C. Psychophysiological Effects of Downregulating Negative Emotions: Insights From a Meta-Analysis of Healthy Adults. Front Psychol. 2020 Apr 16;11:470. doi: 10.3389/fpsyg.2020.00470. PMID: 32372993; PMCID: PMC7177019.
[11] MacCann C, Jiang Y, Brown LER, Double KS, Bucich M, Minbashian A. Emotional intelligence predicts academic performance: A meta-analysis. Psychol Bull. 2020 Feb;146(2):150-186. doi: 10.1037/bul0000219. Epub 2019 Dec 12. PMID: 31829667.
[12] Hammonds C, Cadge W. Strategies of emotion management: not just on, but off the job. Nurs Inq. 2014 Jun;21(2):162-70. doi: 10.1111/nin.12035. Epub 2013 May 27. PMID: 23711017.
[13] Martínez-Morato S, Feijoo-Cid M, Galbany-Estragués P, Fernández-Cano MI, Arreciado Marañón A. Emotion management and stereotypes about emotions among male nurses: a qualitative study. BMC Nurs. 2021 Jun 29;20(1):114. doi: 10.1186/s12912-021-00641-z. PMID: 34182989; PMCID: PMC8240313.