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Núcleos da Base

Os núcleos da base são conjuntos de substância cinzenta, ou seja, de corpos neuronais, localizadas profundamente no telencéfalo, essenciais para o funcionamento cerebral humano. Essas estruturas são cruciais para a coordenação de movimentos, assim como para a regulação de uma série de funções cognitivas, incluindo aprendizado, memória e comportamento emocional. Embora o foco deste texto seja predominantemente anatômico, não se pode ignorar completamente o aspecto funcional, que oferece perspectivas valiosas sobre como estes interagem com outras partes do cérebro para influenciar o comportamento humano.

Neste artigo, exploraremos a neuroanatomia dos núcleos da base, identificando suas principais estruturas e destacando suas características distintas, encerrando junto ao quadro de neuroanatomia do canal Nada Trivial da profª drª Carla Tieppo. Ao fornecer uma visão abrangente da localização e configuração dessas estruturas dentro do telencéfalo, nosso objetivo é facilitar a compreensão de sua importância e das implicações de sua funcionalidade no dia a dia. Este entendimento é vital para profissionais da área de neurociências e para aqueles interessados na base anatômica dos processos cognitivos e motores humanos.

Núcleos ou gânglios?

A terminologia envolvendo os núcleos da base passou por significativas mudanças ao longo dos anos. Historicamente, estas estruturas eram referidas como “gânglios da base”, um termo que foi amplamente utilizado até recentemente. No entanto, ajustamos nomenclatura para “núcleos da base” para estar em conformidade com as convenções modernas da neuroanatomia. O termo “gânglio” é agora reservado para grupos de corpos neuronais localizados fora do sistema nervoso central, como os gânglios do sistema nervoso periférico. Essa distinção terminológica não é apenas uma formalidade, mas reflete uma compreensão mais precisa da localização e função dessas estruturas.

O ajuste na nomenclatura também está alinhado com um entendimento mais profundo da complexidade e do papel funcional dos núcleos da base. Enquanto “gânglios” pode evocar uma imagem de funcionalidade isolada, “núcleos” sugere uma integração mais profunda com outras estruturas cerebrais, o que é crucial para entender como essas áreas influenciam várias facetas do comportamento e da regulação neural. Este ajuste de nomenclatura também é parte de um esforço contínuo na comunidade científica para padronizar termos em face de descobertas que continuam a expandir nossa compreensão do cérebro. Ainda, em língua inglesa, é comum a referência aos mesmos por “basal ganglia”.

Anatomia dos núcleos da base

Localizados no telencéfalo, os núcleos da base são componentes chave do sistema nervoso central, muitos deles de consideráveis dimensões. Esta seção detalha a neuroanatomia dessas estruturas, enfatizando suas localizações e configurações específicas.

  • Estriado: dividido em componentes ventral e dorsal, o estriado desempenha papéis fundamentais na modulação de atividades motoras e comportamentais. O estriado ventral, que inclui o núcleo accumbens, é vital para a formação de hábitos e vícios, mediada pela liberação de dopamina. O estriado dorsal, composto pelo caudado e pelo putamen, interage diretamente com o córtex cerebral, ajudando a avaliar e moldar respostas comportamentais adequadas às situações enfrentadas pelo indivíduo.
  • Globo Pálido: dividido em segmentos interno e externo, o globo pálido é uma estrutura fundamental para o refinamento dos comandos motores que os núcleos da base enviam ao córtex. Suas funções são essenciais para a execução suave e coordenada dos movimentos.
  • Núcleo Subtalâmico: localizado abaixo do tálamo, este núcleo é parte integrante do circuito dos núcleos da base, influenciando uma variedade de funções motoras e comportamentais através de suas conexões com outras estruturas dos núcleos da base e o córtex cerebral.
  • Substância Negra: dividida em duas partes, a pars compacta e a pars reticulata, a substância negra é fundamental para o controle motor e está intensamente envolvida na produção de dopamina. A degeneração dessas áreas é um dos principais fatores patológicos da doença de Parkinson.

Estruturas não clássicas

Essas são algumas das estruturas subcorticais classicamente descritas como sendo pertencentes aos núcleos da base, especialmente pelo seu envolvimento com o planejamento e execução motora. Entretanto, podemos englobar outros conjuntos de corpos celulares podem na definição de núcleos da base por serem estruturas telencefálicas não corticais. São eles:

  • Claustrum: embora não seja classicamente classificado como um dos núcleos da base, o claustrum está envolvido na coordenação de atividades corticais sincronizadas, sugerindo um papel complexo na modulação da consciência e da cognição.
  • Núcleo Pedunculopontino: embora menos conhecido, este núcleo localiza-se na parte inferior do tronco cerebral e interage com os núcleos da base para influenciar diretamente o controle motor, especialmente no que tange à locomoção e à postura.
  • Complexo Amigdaloide: embora não consideremos tradicionalmente parte dos núcleos da base devido ao seu envolvimento no sistema límbico, frequentemente o discutimos complexo amigdaloide em conjunto devido à sua proximidade e interações funcionais. Composta por vários núcleos, esta estrutura tem a forma de uma amêndoa e é crucial para o processamento de memórias com valência emocional e memórias associativas.

Estas estruturas, juntamente com as previamente descritas, formam uma rede complexa de interações que não apenas regulam funções motoras, mas também desempenham papeis importantes em comportamentos cognitivos e emocionais. O entendimento dessa complexidade anatômica é essencial para abordar doenças neurológicas que afetam essas áreas, oferecendo também perspectivas para potenciais terapias.

Aspectos filogenéticos 

Como já abordamos, os núcleos da base se localizam no telencéfalo, mas têm uma origem evolutiva que reflete sua importância funcional. Essas estruturas são algumas das mais antigas deste “quinto andar” em termos de evolução do cérebro dos vertebrados, sugerindo um papel fundamental desde os primeiros estágios do desenvolvimento cerebral.

Estes núcleos antecederam o desenvolvimento do córtex cerebral em termos evolutivos. Inicialmente, estas estruturas desempenhavam funções mais rudimentares e autônomas. No entanto, com o surgimento e a expansão do córtex nos vertebrados, especialmente em mamíferos, os núcleos da base começaram a desempenhar papéis mais sofisticados e assistenciais. Eles evoluíram para funcionar como mediadores cruciais entre o córtex e a execução de comportamentos complexos, facilitando não apenas movimentos, mas também envolvendo-se na cognição e na regulação emocional.

Esta transição dos núcleos da base, de estruturas primariamente motoras para componentes integrativos de redes neurais mais complexas, ilustra um exemplo fascinante de como as funções cerebrais se adaptaram e se tornaram mais refinadas ao longo da evolução. O entendimento dessa progressão filogenética não só ajuda a elucidar seu papel em contextos modernos, mas também destaca a importância de suas funções passadas e como elas se moldaram para atender às demandas de um sistema nervoso mais desenvolvido e complexo.

Uma discussão funcional

Embora este texto foque primariamente na neuroanatomia dos núcleos da base, é crucial destacar brevemente suas funções para apreciar plenamente sua importância no sistema nervoso. Os núcleos da base são intrinsecamente ligados a uma variedade de processos neurológicos, que vão desde o controle motor até aspectos de aprendizado e comportamento.

Funcionalmente, são classicamente conhecidos por sua participação na coordenação e regulação motora. Eles ajudam a facilitar movimentos voluntários e a inibir movimentos involuntários, contribuindo para a fluidez da atividade motora. No entanto, suas funções estendem-se para além do controle motor.

Essas estruturas também desempenham um papel fundamental em comportamentos associados à recompensa, motivação e habituação. Por exemplo, o núcleo accumbens, parte do estriado ventral, é central para o circuito de recompensa do cérebro, influenciando como os indivíduos percebem prazer e reforço positivo, fatores que são essenciais na formação de hábitos e potencialmente em vícios.

Além disso, os núcleos da base interagem de maneira complexa com o córtex cerebral e outras partes do cérebro para influenciar uma gama de funções cognitivas, incluindo a tomada de decisão, o planejamento e até aspectos da personalidade e do humor. A interação com o córtex é crucial para ajustar e refinar as respostas comportamentais a complexas situações sociais e ambientais, permitindo uma adaptação mais eficaz.

A compreensão dessas multifacetadas funções é fundamental para entender não apenas como o cérebro funciona em um estado de saúde, mas também como diferentes desordens neurológicas, como a doença de Parkinson e a doença de Huntington, podem afetar profundamente essas capacidades.