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Vias ascendentes e descendentes

No sistema nervoso, as vias ascendentes e descendentes desempenham um papel fundamental na transmissão eficiente e precisa de informações sensoriais e motoras. Imagine-as como as avenidas nas quais o tráfego constante de informações é essencial para a funcionalidade do organismo. Estas não são estruturas físicas isoladas, mas sim rotas dinâmicas de comunicação, permitindo uma resposta rápida e que coordena as necessidades do corpo. Assim, no texto de hoje, iremos explorá-las, caminhando junto ao quadro de Neuroanatomia do canal Nada Trivial com a profa dra Carla Tieppo.

Por que falar de vias?

O sistema nervoso é o guardião do nosso corpo, responsável por coordenar todas as funções vitais e responder aos estímulos do ambiente. Dividido em duas partes principais, o sistema nervoso central (SNC) e o sistema nervoso periférico (SNP), esta complexa rede de células e fibras neurais é crucial para nossa sobrevivência e bem-estar. Enquanto o SNC, composto pelo cérebro e pela medula espinhal, atua como o centro de comando, processando informações e tomando decisões, o SNP se estende por todo o corpo, conectando o SNC aos órgãos sensoriais e efetores.

Essa comunicação entre o SNC e o SNP é vital para nossa capacidade de perceber o ambiente ao nosso redor e responder apropriadamente a ele. As vias ascendentes e descendentes desempenham um papel fundamental nesse processo, sendo rotas dinâmicas de comunicação e fluxo de informação, permitindo uma transmissão rápida e eficiente de sinais sensoriais e motores.

As vias ascendentes carregam informações sensoriais da periferia para serem processadas no SNC. Desde os sinais de toque e temperatura até a percepção da dor e propriocepção, essas vias garantem que nosso cérebro esteja constantemente atualizado sobre o que está acontecendo em nosso corpo e no ambiente ao nosso redor. Por outro lado, as vias descendentes transmitem comandos do SNC para a periferia, coordenando nossos movimentos e respostas motoras de forma precisa e coordenada.

Vias Ascendentes ou Aferentes

As vias ascendentes, também conhecidas como vias aferentes ou sensitivas, são responsáveis por transmitir informações sensoriais da periferia para o sistema nervoso central (SNC), onde são processadas e interpretadas. Estas vias desempenham um papel crucial na nossa capacidade de perceber estímulos do ambiente e manter uma consciência sensorial precisa do nosso corpo.

Algumas das principais vias ascendentes são:

  • Via Espinotalâmica (Anterolateral): entram na medula espinhal e cruzam para o lado oposto através da comissura branca anterior, ascendendo pela medula espinhal até atingir o tronco encefálico, onde se conectam com os neurônios do núcleo ventral posterior do tálamo, tendo uma função na transmissão de sinais sensoriais de dor e temperatura.
  • Via Lemniscal (Medial e Lateral): entram na medula espinhal e ascendem sem cruzar até o tronco encefálico, onde cruzam para o lado oposto e seguem até o tálamo, sendo responsável pela transmissão de sinais sensoriais de toque, pressão, propriocepção e vibração.

Vias Descendentes ou Eferentes

As vias descendentes, também conhecidas como vias motoras, são responsáveis por transmitir comandos motores do sistema nervoso central (SNC) para a periferia, coordenando os movimentos e respostas motoras do corpo. Estas vias desempenham um papel crucial na nossa capacidade de executar movimentos voluntários e manter o controle sobre nossos músculos e órgãos.

Assim, algumas das principais vias descendentes são:

  • Trato Corticoespinhal (Piramidal): se originam no córtex cerebral, atravessam a cápsula interna, cruzam para o lado oposto na decussação piramidal e descem pela medula espinhal até alcançar os neurônios motores no corno anterior da medula espinhal, transmitindo comandos motores voluntários para os músculos esqueléticos, controlando movimentos finos e precisos.
  • Tratos Extrapiramidais:
    • Trato Vestibuloespinhal: originam-se nos núcleos vestibulares, descem pela medula espinhal para controlar os reflexos de equilíbrio e postura, relacionados ao controle de movimentos associados ao equilíbrio e postura corporal.
    • Trato Rubroespinhal: se originam no núcleo rubro e descem pela medula espinhal para influenciar os movimentos dos membros, facilitam e modulam movimentos voluntários, especialmente dos membros superiores.
    • Trato Retículo-Espinal: se originam nas formações reticulares do tronco encefálico e descem pela medula espinhal para influenciar atividades motoras reflexas e posturais e regulam o tônus muscular, os movimentos reflexos e a postura corporal.

Mielinização no Sistema Nervoso

Para garantir uma comunicação eficiente, muitas das vias ascendentes e descendentes se cobrem com mielina, uma substância que atua como isolante elétrico, permitindo que os sinais nervosos viajem a velocidades impressionantes. Essa cobertura mielinizada é essencial para evitar atrasos e interrupções no fluxo de informação, garantindo que nossas respostas sejam rápidas e precisas.

A mielinização é um processo crucial no desenvolvimento e funcionamento do sistema nervoso, caracterizado pela formação de uma bainha de mielina ao redor dos axônios das células nervosas. Esta substância isolante, composta principalmente de lipídios, desempenha um papel fundamental na transmissão rápida e eficiente dos impulsos nervosos ao longo das fibras nervosas. Ela reduz a capacitância da membrana celular e aumenta a resistência elétrica do axônio, o que resulta em uma propagação mais rápida do potencial de ação ao longo do axônio.

Nas vias ascendentes e descendentes

Enquanto a maioria das vias descendentes é altamente mielizada, nem todas as vias ascendentes são igualmente mielinizadas. Esta variação influencia diretamente na velocidade de transmissão dos impulsos nervosos. Enquanto as fibras não mielinizadas podem transmitir sinais a velocidades relativamente lentas, em torno de 0,5 a 1 metro por segundo, as fibras mielinizadas podem alcançar velocidades impressionantes de até 120 metros por segundo.

Mas isso não torna essas vias lentas obsoletas. Uma característica interessante é a capacidade de compensar as diferenças de velocidade entre diferentes tipos de estímulos sensoriais. Por exemplo, as vias de nocicepção, responsáveis pela transmissão da dor, geralmente são compostas por fibras não mielinizadas e, portanto, transmitem sinais a uma velocidade mais lenta. No entanto, estas vias podem ser compensadas por vias táteis, que são compostas por fibras mielinizadas e transmitem sinais sensoriais mais rapidamente. Esta compensação permite que o sistema nervoso responda eficazmente a uma variedade de estímulos sensoriais, garantindo uma percepção abrangente do ambiente.

Decussação e efeitos de lesões

A decussação, ou cruzamento, é um fenômeno comum em muitas das vias ascendentes e descendentes do sistema nervoso, onde as fibras nervosas mudam de um lado para o outro em algum ponto ao longo do seu trajeto. Este processo tem importantes implicações para a função sensorial e motora do corpo.

Em algumas vias ascendentes, como a via espinotalâmica, as fibras nervosas cruzam para o lado oposto da medula espinhal logo após entrar no sistema nervoso central. Isso significa que os estímulos sensoriais recebidos de um lado do corpo são processados no hemisfério cerebral oposto.

Nas vias descendentes, como o trato corticoespinhal, as fibras nervosas originadas no córtex cerebral cruzam para o lado oposto na decussação piramidal, que ocorre no tronco encefálico, antes de descer pela medula espinhal para controlar os movimentos do corpo.

Pirâmides Bulbares

As pirâmides bulbares são uma representação visual da decussação das fibras nervosas do trato corticoespinhal no tronco encefálico. Estas elevações na superfície ventral do bulbo são formadas pelas fibras nervosas que cruzam na decussação piramidal. Assim, sua presença é uma indicação clara da importância da decussação no controle motor do corpo.

Exemplos de lesões e seus efeitos

Lesões em diferentes locais do sistema nervoso podem resultar em uma variedade de efeitos na função sensorial e motora do corpo, dependendo das vias afetadas e do lado da lesão. Por exemplo, uma lesão na medula espinhal que interrompe as vias ascendentes pode resultar em perda de sensação (anestesia) ou alterações na sensibilidade em partes do corpo abaixo do nível da lesão. Da mesma forma, uma lesão no trato corticoespinhal pode causar fraqueza ou paralisia nos músculos do lado oposto do corpo, devido à decussação das fibras nervosas no tronco encefálico.

Aplicações clínicas e relevância prática

O conhecimento das vias ascendentes e descendentes do sistema nervoso tem uma ampla gama de aplicações na prática clínica, desempenhando um papel crucial no diagnóstico e tratamento de distúrbios neurológicos. Aqui estão algumas das principais maneiras pelas quais esse conhecimento é aplicado na medicina:

  • Diagnóstico: seu entendimento é fundamental para localizar lesões ou disfunções sensoriais ou motoras no sistema nervoso. Por exemplo, a avaliação dos padrões de perda sensorial pode ajudar a determinar a localização e a natureza de distúrbios como neuropatias periféricas, lesões medulares ou cerebrais. Ainda, fraqueza, paralisia ou alterações no controle motor podem indicar problemas no trato corticoespinhal, tratos extrapiramidais ou outras vias motoras.
  • Tratamento: com base nesse entendimento, os médicos podem desenvolver estratégias de tratamento direcionadas para distúrbios específicos. Isso pode incluir terapias medicamentosas, fisioterapia, terapia ocupacional ou cirurgia, dependendo da natureza e gravidade do distúrbio. Por exemplo, o tratamento de lesões na medula espinhal pode envolver intervenções destinadas a promover a recuperação da função sensorial e motora, bem como medidas para prevenir complicações secundárias, como espasticidade ou úlceras de pressão.
  • Monitoramento e prognóstico: o acompanhamento do progresso do paciente ao longo do tempo também se beneficia do conhecimento das vias ascendentes e descendentes. Mudanças na sensação, movimento ou função reflexa podem ser indicadores importantes da recuperação ou progressão de distúrbios neurológicos.