A neurociência do Natal
A melhor época do ano está chegando! O Natal é, sem sombra de dúvidas, um dos feriados mais comemorados ao redor do globo. Apesar de sua conotação religiosa (um verdadeiro mix de diversas crenças), a data é celebrada por bilhões de pessoas, incluindo aqueles que possuem um credo ou não, e costumeiramente é celebrada ao redor de nossos entes queridos, atrelando um forte envolvimento emocional. Além disso, atualmente a comemoração é tida como um dos maiores eventos financeiros do planeta, o que reflete sua importância para grandes empresas. Todas essas questões levantam pontos interessantes a serem discutidos com uma perspectiva da neurociência. Então, de presente para vocês, que tal um texto abordando esses temas?
A rede neural do Natal
Você sabia que a época de festas é tão proeminente e de tamanha relevância na cultura humana que existe uma uma rede neural voltada para o chamado “espírito natalino”? As associações sentimentais de alegria e nostalgia, misturados com os eventos de troca de presentes e imersão numa cena tipicamente decorada que provocam nossos sentidos, como comidas saborosas e cheirosas e enfeites reluzentes, provocam em nós este espírito de natal.
Através da exposição a esse cenário por meio de imagens, cientistas detectaram através da atividade cerebral que áreas associadas com espiritualidade, sensações somáticas e reconhecimento emocional são mais ativadas em pessoas que celebram essa época em relação às pessoas que não a celebram. Uma matéria da Forbes explica o artigo publicado no British Medical Journal com maior facilidade e menos jargões científicos.
Por que temos a impressão de que o Natal chega cada vez mais rápido?
Estudos do cérebro nos auxiliam também a entender porque temos a impressão de que a cada ano que passa, temos a sensação de que o Natal está se aproximando com mais rapidez que no ano anterior. Quando somos crianças, temos a impressão de que essa época não chega nunca: passamos o ano inteiro ansiando pelo tão esperado momento de juntar toda a família, saborear comidas típicas e trocar presentes. Mas quando somos adultos, em um piscar de olhos o final de ano chega. De fato, cerca de 77% dos adultos relatam que esta época se aproxima cada vez mais rápido ao longo dos anos.
Alguns fatores são responsáveis por isso. A nossa percepção de tempo muda à medida que envelhecemos, gerando essa sensação. Afinal, 12 meses para uma criança de 5 anos é uma porcentagem relativa de vida muito mais alta que para adultos. Além disso, a formação de memórias também afeta esse processo, uma vez que a estimação de tempo também é alterada pela quantidade de memórias que formamos neste intervalo. Assim, o restante do ano, no qual menos memórias afetivas são formadas, parece passar mais rápido que o período no qual elas aumentam em quantidade.
A excitação que temos quando jovens em relação ao Natal faz com que prestemos mais atenção ao período que o antecede, meramente pela antecipação do acontecimento. Quando adultos, outros fatores ocupam nossa mente, nos distraindo da passagem de tempo. A matéria da revista Neuroscience News explora um pouco mais essas referências.
A magia da época de festas
Não podemos negar que o Natal é uma época diferente das outras. É realmente como se uma magia tomasse conta do ar. As alegorias usadas durante este período do ano, como as histórias de viagem ao redor do mundo em uma única noite, renas que voam e possuem narizes vermelhos que brilham no escuro, viscos que garantem o romance e decorações cintilantes nos remetem a um mundo mágico e ideal que todas crianças desejam viver. São nada mais que símbolos de alegria, conforto e prosperidade que nos eliciam emoções calorosas e que tanto desejamos sentir.
Saúde mental
Além disso, existe um outro grande fator que contribui para que essa data seja considerada de um encantamento sem igual: faz bem para a nossa saúde mental. O feriado traz momentos de profunda reflexão para aqueles que o celebram, especialmente para os que possuem um envolvimento espiritual com ele. O espírito natalino se manifesta como sentimentos e comportamentos positivos em um espectro coletivo.
As tradições também nos ajudam a gerir nossa ansiedade por conta de sua estrutura e previsibilidade, pois envolvem passos a serem seguidos para se alcançar um objetivo, criando por si só uma sensação de bem-estar e satisfação. Isso acontece porque são capazes de evocar memórias festivas do período, além de garantir maiores níveis de coesão social e conexão entre os indivíduos.
Não suficiente, uma das práticas mais presentes no fim de ano é fazer uma retrospectiva dos seus últimos 365 dias, destacando acontecimentos pelos quais somos gratos. Em momentos difíceis como os que passamos durante a pandemia, essa alegria é ainda mais esperada, como destaca essa fonte da The Conversation.
A emoção atrelada às festividades natalinas
Uma visão contemporânea sobre as emoções relata que estas nada mais são que o seu cérebro resumindo informações sobre seu estado fisiológico, ambiental e experiências passadas. Assim, quando um desses estados se tornam presentes, como por exemplo as decorações de natal, é capaz de eliciar emoções que foram associadas com ele no passado, gerando então um sentimento. E em uma data tão repleta de tradições, como decorar a árvore, fazer comidas típicas, músicas específicas e até mesmo um determinado clima, trazemos à tona diversas formas de eliciar emoções. Neste vídeo do The Project é explicado de forma breve como o Espírito de Natal toma conta de nossas vidas.
Mas, do mesmo jeito que pode ser uma época tão boa para alguns, para outros pode ser um martírio. Os chamados “Grinchs”, devido ao famoso homônimo. Da mesma maneira que são evocadas boas memórias em algumas pessoas, para outras pode evocar experiências negativas. Nessa matéria da Psychology Today podemos ver em mais detalhes como diferentes experiências são atreladas ao clima natalino.
Inteligência Emocional para lidar com a família
Entretanto, nem tudo são flores, não é mesmo? A época de festas pode ser um período que muitos evitam pois implica em se reunir com membros da família com os quais nem sempre estamos no melhor pé, seja por conta de política, preparo da comida ou até mesmo intrigas de infância. Para isso, é necessário estratégias de inteligência emocional para lidar com os familiares que não nos damos bem, evitando estresse e garantindo harmonia entre os integrantes.
O site New York Times recomenda ações simples, como focar nas coisas que há em comum entre as partes, ao invés das diferenças que possam causar atritos, e ainda focar no que está ao seu alcance e em suas próprias ações, e não na dos outros, e até mesmo se afastando caso sinta que a situação está ficando fora de controle. Portanto, a melhor maneira para lidar com situações desconfortáveis é o que a Inteligência Emocional prega: saber ajustar suas ações de acordo com o reconhecimento de suas emoções, sendo a forma como reage a única coisa que você pode mudar. Exercitar a gratidão e a tolerância também são recomendados, sempre focando na comunicação como chave.
Estresse festivo
Assim, a carga emocional atrelada às festividades pode ser extremamente maçante, tornando os dias de celebração e alegria em estresse. A principal causa na qual podemos pensar isso é, como já citado, as relações familiares. Diferenças políticas, geracionais, culturais, de hábitos, falta de privacidade, e até mesmo perda de controle sobre as pessoas podem gerar esse desconforto. Exemplos de estressores podem ser financeiros, ligados à relacionamentos, gatilhos emocionais e também ambientais.
Entretanto, outras características da época de festas também podem intensificar o estresse, como apontado pelo site do The Guardian. As decorações de natal fazem parte de todo o clima criado na época, mas o brilho excessivo, aliado com a constante exposição à músicas repetidas de melodias semelhantes, podem despertar dentro de nós dores de cabeça, cansaço, estresse e mau-humor. Ainda, a carga de trabalho aumenta exponencialmente durante essa época do ano, não somente no emprego, mas também dentro de casa nos preparativos para as festividades, sendo que outra matéria da mesma revista aponta que as mulheres são as mais prejudicadas, principalmente pelas atribuições tradicionalmente relacionadas à gênero.
Além disso, algo que não conseguimos nos livrar com tanta facilidade são as expectativas atreladas à essa época do ano, afinal, ela é construída fortemente em toda a cultura que observamos, como filmes e músicas. Esse viés é conhecido como viés do otimismo, no qual temos a tendência de acreditar que os melhores resultados ocorrerão. Entretanto, a tentativa de viver à altura dessas expectativas e a consequente quebra delas nos tornam cansados e propensos ao estresse, uma vez que não vemos nossos esforços sendo recompensados.